Black metal e depressão (I) - “Ni Tsarya, Ni Boga”: Koldovstvo


  O tempo é imaterial e a sensação de que ele é estático me surrupia enquanto minhas mãos fraquejam sobre tudo o que eu juro ser. Eu sou fraco. A música é um escape e o disco do Koldvstvo produz a iminência do abandono - como se você tivesse deixando esse mundo para sempre. Como se você quisesse sempre isso, mas, na hora derradeira do decisivo adeus, você sentisse saudades de tudo aquilo que odeia. Esses elementos contrastantes têm me consumido como um invisível fogo interno que nunca se materializa de fato, como se eu estivesse sempre à beira de uma revelação que nunca acontece. Eu vivo nessa espera sagrada do nada que nunca se revela.


  A banda é anônima e não se sabe muito sobre ela. Sabe-se que ela é da Rússia e tudo o mais é um mistério. Eu mesmo tentei contatá-los para esse site e ainda não obtive resposta. Os sinais já me prometeram dias melhores, eu mesmo apalpei algo que conjurei como felicidade ou como, quem sabe, duradouro. Mas tudo escapou. Tudo sempre escapa e o que resta sou eu neste quarto há trinta anos ouvindo as mesmas bandas. A tradução de "Ni Tsarya, Ni Boga" seria algo como "Nem rei, nem deus". E, pesquisando sobre os temas concernentes à banda (já que eu nunca vou entender russo), os assuntos abordados nesse disco atmosférico são: melancolia, depressão, escuridão e morte. Há uma sensação de que um outro "eu" que habita este corpo e que eu tenho um medo aterrorizante de me desnudar e me abrir com alguém de verdade e só resta este quarto que se estende há anos como único refúgio. Ao mesmo tempo que eu estou cansado disso, eu só quero isso. Não quero sair. Não quero fazer amigos. Não há deuses aqui, e é essa a tradição que, num jogo de contrariedades e dissolução de oposições simplórias, constrói, junto com as guitarras hipnotizantes, uma libertação do império do outro: seja o capital, as empresas ou as relações arquetípicas que constroem o que se entende por mundo.

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